domingo, 7 de junho de 2009

Cantiga de Malazartes, de Murilo Mendes Campos

Eu sou o olhar que penetra nas camadas do mundo,
ando debaixo da pele e sacudo os sonhos.
Não desprezo nada que tenha visto,
Todas as coisas se gravam para sempre na minha cachola.
Toco nas flores, nas almas, nos sons, nos movimentos,
Destelho as casas penduradas na terra,
Tiro o cheiro dos corpos das meninas sonhando.
Desloco as consciências,
A rua estala com os meus passos,
E ando nos quatro cantos da vida.
Consolo o herói vagabundo, glorifico soldado vencido,
Não posso amar ninguém porque sou o amor,
Tenho me surpreendido a cumprimentar os gatos
E a pedir desculpas ao mendigo.
Sou o espírito que assiste à Criação
E que bole em todas as almas que encontra.
Múltiplo, desarticulado, longe como o diabo,
Nada me fixa nos caminhos do mundo.



Murilo Monteiro Mendes nasceu em Juiz de Fora, em 13 de maio de 1901. Concluiu seus estudos primários e ginasiais na cidade, indo logo depois para o colégio interno Santa Rosa, em Niterói, de onde fugiu em determinada ocasião para assistir Nijinski, no Teatro Municipal do Rio. Foi, enfim, para o Rio, onde passa a exercer a função de arquivista na Diretoria de Patrimônio Nacional, Ministério da Fazenda. Aproximou-se do surrealismo e escreveu inúmeros poemas modernistas. Colaborou com artigos em jornais. Escreveu nas primeiras revistas do modernismo, como "Revista da Antropofagia" e "Verde". Faleceu em Lisboa, em agosto do ano de 1975.

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