sexta-feira, 1 de junho de 2012

PASSEI TODA A NOITE , de Fernando Pessoa




Passei toda a noite, sem dormir, vendo, sem espaço, a figura dela,


E vendo-a sempre de maneiras diferentes do que a encontro a ela.


Faço pensamentos com a recordação do que ela é quando me fala,


E em cada pensamento ela varia de acordo com a sua semelhança.


Amar é pensar.


E eu quase que me esqueço de sentir só de pensar nela.


Não sei bem o que quero, mesmo dela, e eu não penso senão nela.


Tenho uma grande distracção animada.


Quando desejo encontrá-la


Quase que prefiro não a encontrar,


Para não ter que a deixar depois.


Não sei bem o que quero, nem quero saber o que quero. Quero só Pensar nela.


Não peço nada a ninguém, nem a ela, senão pensar.






(”O Guardador de Rebanhos”, “Obra Completa”, Ed. Aguilar, 1960, pág. 312.)






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