domingo, 17 de junho de 2012

OS PODERES INFERNAIS , de Carlos Drummond de Andrade




O meu amor faísca na medula,

pois que na superfície ele anoitece.

Abre na escuridão sua quermesse.

É todo fome, e eis que repele a gula.



Sua escama de fel nunca se anula

e seu rangido nada tem de prece.

Uma aranha invisível é que o tece.

O meu amor, paralisado, pula.



Pulula, ulula. Salve, lobo triste!

Quando eu secar, ele estará vivendo,

já não vive de mim, nele é que existe



o que sou, o que sobro, esmigalhado.

O meu amor é tudo que, morrendo,

não morre todo, e fica no ar, parado.





(in OBRA COMPLETA, ED. AGUILAR, 1964, PAG. 321)


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