terça-feira, 2 de outubro de 2012

A BELA ADORMECIDA, de Adélia Prado



Estou alegre e o motivo

beira secretamente à humilhação,

porque aos 50 anos (?)

não posso mais fazer curso de dança,

escolher profissão,

aprender a nadar como se deve.

No entanto, não sei se é por causa das águas,

deste ar que desentoca do chão as formigas aladas,

ou se é por causa dele que volta

e põe tudo arcaico, como a matéria da alma,

se você vai ao pasto,

se você olha o céu,

aquelas frutinhas travosas,

aquela estrelinha nova,

sabe que nada mudou.

O pai está vivo e tosse,

a mãe pragueja sem raiva na cozinha.

Assim que escurecer vou namorar.

Que mundo ordenado e bom!

Namorar quem?

Minha alma nasceu desposada

com um marido invisível.

Quando ele fala roreja

quando ele vem eu sei,

porque as hastes se inclinam.

Eu fico tão atenta que adormeço

a cada ano mais.

Sob juramento lhes digo:

tenho 18 anos. Incompletos.


(Sinto falta quando deixo de ler Adélia ! Imperdoável !!!)

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