Em todos os períodos de férias escolares, desde os meus 5 anos, íamos para o sul da Bahia, onde meu pai tinha uma fazenda. Lá, ficávamos numa casinha simples feita de barro com janelinhas de madeira. Na frente, algumas flores, banquinhos de madeira, uma árvore linda. Lembro-me de ficar sentada ali em um daqueles banquinhos algumas horas, às vezes até me deitava, admirando o vento balançando a copa da árvore, a paisagem que era linda e à noite as estrelas que inundavam o nosso céu. Ali naqueles banquinhos também ouvíamos os causos de quem lá vivia. Na parte de trás da casa, ficava a cozinha com fogão a lenha, uma janela que se abria para o quintal e o pomar. A casa não tinha forro, podíamos ver as telhas. O banheiro ficava fora da casa. A casinha tinha dois quartos, ficávamos todos num quarto, meu pai, minha mãe e os cinco filhos, todos juntinhos ali. No outro quarto ficava seu Expedito e dona Nega, que lá moravam. Seu Expedito usava chapeuzinho de couro e carregava na cintura um cinto engraçado, onde pendurava, um facão, um canivete e outros apetrechos. Dona Nega, hoje causaria inveja em muita mulher por ai, era magrinha e toda musculosa e estava sempre de vestido, era muito ativa e conversadeira.
Em um desses verões, a camionete mal estacionou, pulamos logo da carroceria, corremos todos para o quintal, direto ao pé de amora, quem era mais alto levava vantagem, eu e a Raquel estávamos sempre em desvantagem. O quintal de terra batida, abrigava vários moradores, alguns cães, gatos, galinhas, galos, pintinhos, porco..... Logo vimos um morador diferente, era um peru. Glu, glu, glu, glu, glu, glu, glu, glu.
Dona Nega veio logo avisar, cuidado com esse bicho ele não é bom da cabeça. Fiquei assustada, bonito ele não era. Era quase do meu tamanho, não gostei nada disso! Passei a andar somente ao lado de quem era maior que eu, assim me sentia mais segura mas estava sempre vigiando o peru.
Sentava na porta da cozinha que ficava virada para o quintal eu observava o movimento dos moradores daquele lugar. O galo era o primeiro a levantar e acordava a todos, todos os dias. Sempre atento punha ordem no terreiro. As galinhas eram as mais simpáticas, algumas pareciam sorrir pra mim, as que eram mães eram muito metidas, andavam empinadas com uma penca de pintinhos ao redor, não deixavam que a gente chegasse perto. De vez em quando dona Nega pegava um pintinho pra gente passar a mão e a galinha mãe ficava lá resmungando e brigando, mas logo devolvíamos. Os cães eram curiosos, queriam nos conhecer, nos cheirar, não eram bravos eu tinha medo deles, mas eles nos respeitavam, só queriam ser amigos e estar juntos da gente. Os porcos ficavam no chiqueiro, mas de vez em quando apareciam no quintal pra dar umas voltinhas. Os gatinhos eram muito engraçadinhos se esfregavam em nossas pernas, mas não podíamos estar com eles, porque éramos alérgicas ao pelo deles, minha mãe não gostava que eles ficassem perto da gente. O peru era engraçado ia de um lado ao outro muito desengonçado, ninguém queria muito papo com ele, vi um dos cães correr atrás dele, acho que não era muito compreendido pelos outros moradores, às vezes era metido abria suas asas querendo aparecer, até junto com os de sua espécie costumava discutir. Prestava muita atenção nele, ele não sabia onde ir, rodava pra lá e pra cá, gritava seu glu, glu, glu, sem parar. Quando ele estava longe me arriscava a andar pelo quintal, quando ele se aproximava corria pra cozinha.
Me deu vontade de ir ao banheiro, pedi minha mãe pra me levar, ela estava ocupada com a dona Nega, preparando uma pamonha. Então resolvi ir sozinha, me empinei pra ficar mais alta, fiz de conta que o peru não existia, cheguei até o banheiro sem nenhum problema. Na volta, fiz a mesma coisa, só que não funcionou o bicho me viu de longe e veio correndo ao meu encontro, comecei a correr e gritar, dei umas duas voltas em círculo e ele vinha atrás de mim. Dona Nega veio logo me socorrer, me pegou no colo e ameaçou o peru com um pedaço de pau, que saiu correndo sumindo no pomar.
Depois do susto, começamos a rir, na hora não teve graça, mas depois, ríamos sempre que lembrávamos do acontecido.
Há pouco tempo descobri que também existe homem peru tonto. Normalmente ele tem mais de 40 anos, chega sempre chamando atenção, te olha de cima em baixo analisando suas curvas, sem se preocupar se é comprometida ou não. Logo se expõe é sempre bem sucedido, aventureiro e se mostra ser tudo de bom, geralmente é casado e pensa ser um excelente pai, o pai legal, firme quando tem que ser firme e divertido na hora certa. O discurso deles é sempre contraditório, conseguem ir do norte, ao sul, a leste e a oeste, em um curtíssimo espaço de tempo. Eles não tem lado e se achar que você é uma pessoa interessante começa a te cortejar, ao mesmo tempo que fala da esposa e dos filhos. Quando percebo isso começo logo a pedir socorro e digo frases como: “Sangue de Cristo tem poder e misericórdia”, “Só Jesus”. E ai começo a rir por dentro. A primeira pergunta é sempre assim:
Você é protestante?
E quando digo que sou católica, pronto, é a abertura para uma enxurrada de asneiras. Sou obrigada a ouvir que todo padre é gay, que a igreja rouba, que todo fiel é fanático e um montão de outras asneiras. Quando eles percebem que não dou muita atenção, ai eles dão aula de astrologia, de modos de vida zen, alguns confessam que maconha é legal. E por aí vai! Ao final só me resta rir e ainda fico com pena desse bicho tonto. O que mais me impressiona é que eles tem esposa e filhos. Conseguem destruir seus casamentos e abandonar seus filhos à procura de uma falsa felicidade. A única coisa que sempre faço é pedir a Deus que dê um jeito neles, que lhes abra os olhos e que eles vejam que a felicidade está muito mais próxima deles, do que eles pensam. E sabe, isso não acontece somente com os homens não, também já vi mulher tonta por aí. Que pena! Quem mais sofre com isso são os filhos.
“Esse indivíduo se alimenta de cinzas, as fantasias de sua mente fazem-no perder o rumo, não consegue salvar a própria vida, é incapaz de dizer: Não será mentira o que tenho nas mãos?” (Isaías 44, 20)
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