sábado, 28 de abril de 2012

Amar, de Carlos Drummond de Andrade

É essencial para a compreensão plena da obra de Drummond a leitura de seus poemas eróticos ! São densos , explicítos ! Belíssimos ! Leiam esse.




AMOR- pois que é palavra essencial


comece esta canção e toda a envolva.


Amor guie o meu verso, e enquanto o guia,


reúna alma e desejo, membro e vulva.






Quem ousará dizer que ele é só alma?


Quem não sente no corpo a alma expandir-se


até desabrochar em puro... grito


de orgasmo, num instante de infinito?






O corpo noutro corpo entrelaçado,


fundido, dissolvido, volta à origem


dos seres, que Platão viu completados:


é um, perfeito em dois; são dois em um.






Integração na cama ou já no cosmo?


Onde termina o quarto e chega aos astros?


Que força em nossos flancos nos transporta


a essa extrema região, etérea, eterna?






Ao delicioso toque do clitóris,


já tudo se transforma, num relâmpago.


Em pequenino ponto desse corpo,


a fonte, o fogo, o mel se concentraram.






Vai a penetração rompendo nuvens


e devassando sóis tão fulgurantes


que nunca a vista humana os suportara,


mas, varado de luz, o coito segue.






E prossegue e se espraia de tal sorte


que, além de nós, além da própia vida,


como ativa abstração que se faz carne,


a idéia de gozar está gozando.






E num sofrer de gozo entre palavras,


menos que isto, sons, arquejos, ais,


um só espasmo em nós atinge o climax:


é quando o amor morre de amor, divino.






Quantas vezes morremos um no outro,


no úmido subterrâneo da vagina,


nessa morte mais suave do que o sono:


a pausa dos sentidos, satisfeita.






Então a paz se instaura. A paz dos deuses,


estendidos na cama, qual estátuas


vestidas de suor, agradecendo


o que a um deus acrescenta o amor terrestre.






(in "Poema Natural" , Ed. Nova Fronteira, 1992, pág. 45)Ver mais





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