sexta-feira, 6 de julho de 2012

MIMOSA BOCA ERRANTE , de Carlos Drummond de Andrade





Mimosa boca errante


à superfície até achar o ponto


em que te apraz colher o fruto em fogo


que não será comido mas fruído


até se lhe esgotar o sumo cálido


e ele deixar-te, ou o deixares, flácido,


mas rorejando a baba de delícias


que fruto e boca se permitem, dádiva.






Boca mimosa e sábia,


impaciente de sugar e clausurar


inteiro, em ti, o talo rígido


mas varado de gozo ao confinar-se


no limitado espaço que ofereces


a seu volume e jato apaixonados


como podes tornar-te, assim aberta,


recurvo céu infindo e sepultura?






Mimosa boca e santa,


que devagar vais desfolhando a líquida


espuma do prazer em rito mudo,


lenta-lambente-lambilusamente


ligada à forma ereta qual se fossem


a boca o próprio fruto, e o fruto a boca,


oh chega, chega, chega de beber-me,


de matar-me, e, na morte, de viver-me.






Já sei a eternidade: é puro orgasmo.






("Poemas Eróticos" , Companhia das Letras, 2009)



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