Pretendo com este modesto blog compartilhar com os amigos as minhas algumas criações e estimular a leitura de grandes obras de arte, comentários sobre museus e viagens, restaurantes e uma série de coisas boas. Garanto que você vai gostar, mais ou menos, mas vai !
sexta-feira, 31 de agosto de 2012
POESIA: ESTE SILÊNCIO , de Jorge Bichuetti
Nenhuma voz, nem grito;
não escuto a canção do vento.
nem ouço meu sibilante coração...
Mergulhado neste profundo silêncio,
a vida passa e nada noto,
ela voa e não vejo as nuvens;
sinto somente na pele
as marcas do tempo
e desnudo, percebo o horizonte:
o azul não precisa de palavras,
ele é... o infinito que, no silêncio,
canta... com risos e prantos,
semeando mudas e sementes
que me inunda de alegria ao ver-me,
simplesmente, ponto faíscante no espaço sem fim;
uma pequenez embriagada pelos eflúvios da imensidão.
No silêncio, eu não sou;
mas, caminho estando entre a chegda e a partida,
entre a claridade e a escuridão...
Nele, eu sou um vagalume no meio da
ciranda dos deuses, um cisco no útero sideral:
eu sou u'a flor na janela da vida,
esperando escutar a derradeira seresta.
para seguir além sendo tão-somente
o bailado da folha seca que aduba o solo,
refazendo a roda-viva da procriação...
(Blog de Jorge Bichuetti Poesia Ativa)
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quinta-feira, 30 de agosto de 2012
NOSSO TEMPO , de Carlos Drummond de Andrade
Por ocasião de cada eleição, principalmente nos momentos que a precede, costumo colocar esse exepcional poema do nosso Drummond à reflexão das pessoas de boa fé ! É o que faço nesse momento! E sugiro a leitura de sua integralidade.
Este é tempo de partido,
Tempo de homens partidos.
Em vão percorremos volumes,
viajamos e não colorimos.
A hora pressentida esmigalha-se em pó na rua.
Os homens pedem carne. Fogo. Sapatos.
As leis não bastam. Os lírios não nascem
da lei. Meu nome é tumulto e escreve-se
na pedra.
Visito os fatos, não te encontro.
Onde te ocultas, precária síntese,
penhor de meu sono, luz
dormindo acesa na varanda?
Miúdas certezas de empréstimo, nenhum beijo
Sobe ao ombro para contar-me
As cidades dos homens completos.
Calo-me, espero, decifro.
As coisas talvez melhorem.
São tão fortes as coisas!
Mas eu não sou as coisas e me revolto.
Tenho palavras em mim buscando canal,
são roucas e duras,
irritadas, enérgicas,
comprimidas há tanto tempo, perderam o sentido,
apenas querem explodir.
( “A ROSA DO POVO”, Companhia Aguilar Editora, 1964, pag. 144)
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quarta-feira, 29 de agosto de 2012
TRÊS COISAS , de Fernando Pessoa
(Como sempre disse, esses versos são para ser lidos, no mínimo, três vezes por semana)
De tudo, ficaram três coisas:
a certeza de que estamos
sempre começando,
a certeza de que é preciso continuar,
a certeza de que seremos
interrompidos antes de terminar.
Portanto, devemos fazer da
interrupção um caminho novo,
da queda um passo de dança,
do medo uma escada,
do sonho uma ponte,
da procura um encontro.
(in “Quando fui outro”, Ed. Alfaguara, 2006)
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terça-feira, 28 de agosto de 2012
DIZES-ME , de Fernando Pessoa
(Inéditas", "Obra Completa", Ed. Aguilar, 1960,
pag.365)
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segunda-feira, 27 de agosto de 2012
LINHA DE UM POEMA , de Golda Meir
Minha nota: sempre fui um grande admirador dessa exepcional mulher, grande estadista, mas, antes de tudo, dotada de uma sensibilidade admirável! Veja por esse poema.
A sua presença
Faz-me respirar com dificuldade
Como uma gaita de fole
Mas sua ausência me asfixia completamente
Faz-me uma mulher trêmula
Que dura o tempo da voz
Despojada e não livre
Que hoje tira o que se tem vestida
Procede (quase) sem medo
Mostrando a totalidade do que existe
Tal qual é
Revelando o essencial
E com inicial maiúscula
Faço minha oração
Como se fora a linha de um poema
Em grego, latim ou português...
Sem compreender muito bem
E como um movimento literário experimental pronto
Apreendendo-te
De fato em equivalência
Qualquer
Melindrada
Por seu autoritarismo
Por seu falso regime de solidão
Tenho a significação do seu sentido
Sua iniciativa de falta
Estou apta para receber as impressões
Que me causa o teu olhar cravado em mim
A tua pessoa enraizada aqui
Ama em maior grau
De um amor incrédulo
Se jogar apenas com as cartas que tem a mão
Perderá
Porto-me em oposição a esta derrota mútua
Ponho-me a teu favor...
Não podemos ajuizar o futuro se não temos presente
Abster-se não é responder à vida
Omitir-se não é desfazer o nó
Segredar não é o mesmo que não deixar existir
Quietude não é calmaria
Silêncio não é possibilidade
E o amor não pode ser aliado da covardia
("Poemas", ABL, 1981)
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sexta-feira, 24 de agosto de 2012
O CORPO HUMANO
No mundo só há um templo: o corpo humano.
Nada mais sagrado do que esta forma sublime.
Inclinarmo-nos perante uma mulher,
é render homenagem a esta revelação da carne.
É no céu que tocamos quando tocamos num corpo humano.
O ser amado é o centro de um paraíso...
Inclinarmo-nos perante uma mulher,
é render homenagem a esta revelação da carne.
É no céu que tocamos quando tocamos num corpo humano.
O ser amado é o centro de um paraíso...
quinta-feira, 23 de agosto de 2012
OS DIAS FELIZES , de Cecília Meireles
Os dias felizes estão entre as árvores, como os pássaros:
viajam nas nuvens,
correm nas águas,
desmancham-se na areia.
Todas as palavras são inúteis,
desde que se olha para o céu.
A doçura maior da vida
flui na luz do sol,
quando se está em silêncio.
Até os urubus são belos,
no largo círculo dos dias sossegados:
formigas ávidas devoram
a albumina do pássaro frustado.
Caminhávamos devagar,
ao longo desses dias felizes,
pensando que a Inteligência
era uma sombra da Beleza.
("Mar Absoluto/Retrato Natural", Ed. Nova Fronteira, 1983, pág.153)
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quarta-feira, 22 de agosto de 2012
O HOMEM E A MULHER , de Victor Hugo
O homem é a mais elevada das criaturas.
A mulher é o mais sublime dos ideais.
Deus fez para o homem um trono.
Para a mulher, um altar.
O trono exalta.
O altar santifica.
O homem é o cérebro; a mulher é o coração.
O cérebro fabrica a luz; o coração produz Amor.
A luz fecunda.
O Amor ressuscita.
O homem é forte pela razão.
A mulher é invencível pelas lágrimas.
A razão convence.
As lágrimas comovem.
O homem é capaz de todos os heroísmos.
A mulher, de todos os martírios.
O heroísmo enobrece.
O martírio sublima.
O homem tem a supremacia.
A mulher, a preferência.
A supremacia significa a força.
A preferência representa o direito.
O homem é um gênio; a mulher, um anjo.
O gênio é imensurável; o anjo, indefinível.
Contempla-se o infinito.
Admira-se o inefável.
A aspiração do homem é a suprema glória.
A aspiração da mulher é a virtude extrema.
A glória faz tudo grande.
A virtude faz tudo divino.
O homem é um código.
A mulher, um evangelho.
O código corrige.
O evangelho aperfeiçoa.
O homem pensa.
A mulher sonha.
Pensar é ter no crânio uma larva.
Sonhar é ter na fronte uma auréola.
O homem é um oceano.
A mulher um lago.
O oceano tem a pérola que adorna.
O lago, a poesia que deslumbra.
O homem é a águia que voa.
A mulher é o rouxinol que canta.
Voar é dominar o espaço.
Cantar é conquistar a alma.
O homem é um templo.
A mulher é o sacrário.
Ante o templo nos descobrimos.
Ante o sacrário nos ajoelhamos.
Enfim, o homem está colocado onde termina a terra.
E a mulher onde começa o céu.
("Victor Hugo: Obra Quase Completa", Ed. Melhoramentos, 1975)
Meu comentário: há quem diga que trata-se de um poema "machista do grande Victor Hugo. Não acho , ele apenas exaltou o homem como trampolim para enaltecer a mulher ! Conseguiu !
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terça-feira, 21 de agosto de 2012
POEMA DO AMOR PERFEITO , de Cecília Meireles
Naquela nuvem, naquela,
mando-te meu pensamento:
que Deus se ocupe do vento.
Os sonhos foram sonhados,
e o padecimento aceito.
E onde estás, Amor-Perfeito?
Imensos jardins da insônia,
de um olhar de despedida
deram flor por toda a vida.
Ai de mim que sobrevivo
sem o coração no peito.
E onde estás, Amor-Perfeito?
Longe, longe, atrás do oceano
que nos meus olhos se aleita,
entre pálpebras de areia...
Longe, longe... Deus te guarde
sobre o seu lado direito,
como eu te guardava do outro,
noite e dia, Amor-Perfeito.
("Mar Absoluto e Outros Poemas", Ed. Nova Fronteira, 1983)
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segunda-feira, 20 de agosto de 2012
SEM TÍTULO , e ATRIBUÍDO a Gabriel Garcia Marques
Te amo não por quem tu és,
se não por quem sou quando estou contigo
Nenhuma pessoa merece tuas lágrimas,
e quem as mereça não te farão chorar
Só porque alguém não te ama como tu desejas,
não significa que não te ame com todo seu ser
Um verdadeiro amigo
é quem te pega da mão e te toca o coração
A pior forma de sentir falta de alguém
é estar sentado a seu lado e saber que nunca o poderás ter
Nunca deixes de sorrir, nem mesmo quando estejas triste
porque nunca sabes quem poderá enamorar-se de teu sorriso
Podes ser somente uma pessoa para o mundo,
mas para alguma pessoa tu és o mundo
Não passes o tempo com alguém
que não esteja disposto a passá-lo contigo
Quem sabe Deus queira que conheças
muita gente enganada antes de que conheças à pessoa adequada,
para que quando no fim a conheças, saibas estar agradecido
Não chores porque já terminou,
sorria porque aconteceu
Sempre haverá gente que te machuque,
assim, o que tens de fazer
é seguir confiando e só ser mais cuidadoso
com em quem confias duas vezes
Converte-te em uma melhor pessoa e
assegura-te de saber quem és
antes de conhecer mais alguém
e esperar que essa pessoa saiba quem és
Não te esforces tanto,
as melhores coisas acontecem quando menos esperas
Nota importante:
Existem controvérsias quanto à autoria desse poema. Há quem diga que é apócrifo e não é de Garcia Garcia Marquez. O que deixa-me perplexo: como um autor não divulgaria uma obra dessas?
sexta-feira, 10 de agosto de 2012
TEMPO , do meu amigo sempre lembrado, Paulo Alberto Monteiro de Barros, o Artur da Távola.
(Bom amigo , de muitas lutas, perigosas, de quem tenho muita saudade)
Hoje eu sou poesia,
Pedaço de nuvem
Nas mãos do teu dia.
Eu sou amargura,
Espaço de espanto
Num céu de loucura.
Hoje eu quero ser jardim,
Temporada de espanto
No sorriso de teu sim.
Agora vai ser a vez
Da esperança sem lança,
Da amizade sem força,
Do afago sem sexo,
Do sexo sem falsa noção de esmagar.
Chegou o tempo
De ser
E amar.
("Outros Escritos" , Ed. Record, 1999)
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quinta-feira, 9 de agosto de 2012
AMOR , do meu amigo Darcy Ribeiro
Quero um amor alucinado, depravado, tarado.
Amor inteiro, de corpo-a-corpo, enlaçados.
Amor sem reserva, que a tudo se entrega, lancinante.
Quero você assim, abrasada, pedindo gozo,
Eriçada, ronronando feito gata, tesuda.
Seus seios túmidos, me furando o peito.
Quero você, pentelho contra pentelho, roçantes.
Carne encravada na carne. Bocas coladas,
Babadas, meladas, sangrando sufocadas.
Quero amar você tão bichalmente que urremos.
Eu, penetrando rasgando. Você me comendo furiosa.
Nós dois fundidos, unidos, soldados.
Você e eu, nós dois, sós, neste mundo dos outros.
(Tenho o manuscrito desse poema, que me foi entregue em Maricá, no refúgio de meu amigo. Prometi entrega-lo, ainda nesse ano, á Academia Brasileira de Letras)
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quarta-feira, 8 de agosto de 2012
SONETO DA VIDA NOVA , de Dante Alighieri
Tão discreta e gentil que me afigura
ao saudar, quando passa, a minha amada,
que a língua não consegue dizer nada
e a fitá-la, o olhar não se aventura.
Ela se vai sentindo-se louvada
envolta de modéstia nobre e pura.
Parece que do céu essa criatura
para atestar milagre foi baixada.
Ao que a contempla infunde tal prazer,
pelos olhos transmite tal doçura,
que só quem prova pode compreender.
E assim, parece, o seu semblante inspira
um delicado espírito de amor
que vai dizendo ao coração, que suspira ...
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terça-feira, 7 de agosto de 2012
TERNURA , de Vinicius de Moraes
Eu te peço perdão por te amar de repente
Embora o meu amor seja uma velha canção nos teus ouvidos
Das horas que passei à sombra dos teus gestos
Bebendo em tua boca o perfume dos sorrisos
Das noites que vivi acalentado
Pela graça indizível dos teus passos eternamente fugindo
Trago a doçura dos que aceitam melancolicamente
E posso te dizer que o grande afeto que te deixo
Não trai o exaspero das lágrimas nem a fascinação das promessas
Nem as misteriosas palavras dos véus da alma...
É um sossego, uma unção, um transbordamento de carícias
E só te pede que te repouses quieta, muito quieta
E deixes que as mãos cálidas da noite encontrem sem fatalidade o olhar extático da aurora.
( in 'Antologia Poética' , Ed. Sabiá, 1972)
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quinta-feira, 2 de agosto de 2012
DE TANTO VER , texto de Otto Lara Resende
Tive o privilégio de conviver com o Otto ! Sempre lembrado !
De tanto ver, a gente banaliza o olhar. Vê não vendo.
Experimente ver pela primeira vez o que você vê todo dia, sem ver.
Parece fácil, mas não é. O que nos cerca, o que nos é familiar, já não desperta tanta curiosidade. O campo visual da nossa rotina é como um vazio.
Você sai todo o dia, por exemplo, pela mesma porta. Se alguém lhe perguntar o que você vê no seu caminho, você não sabe.
De tanto ver, você não vê.
("Otto Lara Resende e seus pensamentos", em "O GLOBO")
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quarta-feira, 1 de agosto de 2012
SAUDADE, de Pablo Neruda
Saudade - O que será... não sei... procurei sabê-lo
em dicionários antigos e poeirentos
e noutros livros onde não achei o sentido
desta doce palavra de perfis ambíguos.
Dizem que azuis são as montanhas como ela,
que nela se obscurecem os amores longínquos,
e um bom e nobre amigo meu (e das estrelas)
a nomeia num tremor de cabelos e mãos.
Hoje em Eça de Queiroz sem cuidar a descubro,
seu segredo se evade, sua doçura me obceca
como uma mariposa de estranho e fino corpo
sempre longe - tão longe! - de minhas redes tranquilas.
Saudade... Oiça, vizinho, sabe o significado
desta palavra branca que se evade como um peixe?
Não... e me treme na boca seu tremor delicado...
Saudade...
( "Crepusculário" , tradução de Rui Lage , Ed. Civilização Brasileira, 1974)
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